Critica do Inventario no JBC
O riso crítico
O riso e a crítica nem sempre foram vistos com bons olhos ao longo da história. Proibições morais e institucionais impediam sua livre existência. Em pleno século XXI, não temos mais estas amarras ideológicas no ocidente para nos reprimir, mas a liberdade também traz seus desafios. O riso e a crítica nem sempre são tratados com o respeito que merecem. Neste sentido, é maravilhoso encontrar um grupo de teatro que se propõe a encarar este desafio de frente e sem as facilitações que a maioria acaba optando. O espetáculo “Inventário” do Doutores Palhaços do Grupo Roda Gigante é um bom exemplo disto. A temática da vivência em hospitais, que é fruto das intervenções destes atores no mundo hospitalar do Rio de Janeiro, é instigante e ao mesmo tempo nos coloca contra a parede. Como a dor pode ser engraçada? Trabalhar neste limite é a maior virtude do espetáculo. Os atores e atrizes conseguiram extrair dos seres humanos que formam o universo hospitalar a essência da experiência humana diante do dolorido espectro da morte. Estes trabalhadores do teatro são muito sérios. Parece estranho quando estamos falando de artistas-palhaços. Mas, estar em cena e saber fazer, inclusive a autocrítica de suas próprias ações não é para qualquer um. Atores e atrizes que não caminham pelo fácil e que conseguem trazer a platéia para dentro da cena com segurança, sem medo de romper as paredes que normalmente se colocam entre ator e público. A técnica dos atores e atrizes está sob a pele, impregnada e orgânica, ela está a serviço do fazer teatral. Uma direção competente que sabe organizar o caos. Isto é ser diretor, não deixar que o excesso se imponha nem tampouco colocar os atores numa camisa de força. Direção que, mesmo investindo em cenas frontais, não deixa se perder o que ocorre ao fundo, tão relevante como o que ocorre no procênio. O “Inventário” é destes espetáculos que nos fazem rir e chorar. Emocionamo-nos muito ao longo do trabalho. Que bom ver a crítica inteligente e embasada e o riso que não é barato. A comédia é isto, coisa séria. Vida longa ao “Inventário”.
Lourival Andrade
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